Palavras ditas ...

Se eu gosto de poesia?
Gosto de gente, bichos, plantas, lugares, chocolate, vinho, papos amenos, amizade, amor... Acho que a poesia está contida nisso tudo."
Carlos Drumond de Andrade

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Esperança


Espero
Desespero
Por aquela notícia boa
seja ela qual for
- «ó joaninha voa voa
que o teu pai está em Lisboa» -
que amacie este amargor
e que sem saber ler nem escrever
dê sentido a este viver

Fernando Semana


Copiado daqui

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Plano

















Trabalho o poema sobre uma hipótese: o amor
que se despeja no copo da vida, até meio, como se
o pudéssemos beber de um trago. No fundo,
como o vinho turvo, deixa um gosto amargo na
boca. Pergunto onde está a transparência do
vidro, a pureza do líquido inicial, a energia
de quem procura esvaziar a garrafa; e a resposta
são estes cacos, que nos cortam as mãos, a mesa
da alma suja de restos, palavras espalhadas
num cansaço de sentidos. Volto, então, à primeira
hipótese. O amor. Mas sem o gastar de uma vez,
esperando que o tempo encha o copo até cima,
para que o possa erguer à luz do teu corpo
e veja, através dele, o teu rosto inteiro.

Nuno Júdice




quarta-feira, 15 de maio de 2013

Os Amantes Obscuros



Nossos sentidos juntos fazem chama: 
e as fantasias nossas vão soltar 
os desejos desertos de quem ama 
e em verso ou coração se quis tornar. 

Nossos sentidos são matéria prima 
de um canto que é mais leve do que o ar; 
o mundo todo não nos adivinha: 
somos sombra sem luz, sequer luar. 

Que o corpo quebre a noite desolada, 
que o corvo ceda a voz à escuridão: 
mil luzes são o nome da amada; 
quem se perdeu no verso é sem perdão. 

Luís Filipe Castro Mendes


Imagem copiada daqui e o poema daqui

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Orações do amor


... ... ... ... ...
XXI


Dizem as conchas do mar:
«Não queiras que desça ao fundo
Quem nos deseja roubar.»



E as águas dizem ao mundo:
«Olha, não mandes sondar
O nosso abismo profundo.»

Como as conchas, como as águas,
Digo à minha estremecida:
«Não queiras roubar-me a vida,
Não sondes as minhas mágoas...»

António Fogaça





Imagem retirada daqui

domingo, 5 de maio de 2013

Mãe



Mãe a palavra universal a palavra mais consensual da humanidade
Nem Deus… Deus é de uns e não de outros Deus é conceito de muitos e negação de outros tantos
A mãe não a mãe é de todos sem excepção
A mãe é de todos e é só nossa a mãe é do crente e do ateu a mãe é do pobre e do rico do sábio e do ignorante
A mãe é dos poetas dos filósofos e artistas dos bons e dos maus a mãe é do amigo e do inimigo
Não há mãe de uns e não de outros não há ninguém sem mãe não há mãe de ninguém
A mãe é de toda a gente a mãe é de cada um a mãe é do mundo inteiro e do nosso mais pequeno recanto
A mãe é do longe e do perto da água e do fogo do sangue e das lágrimas da alegria e da tristeza da doçura e da amargura da força e da fraqueza
A mãe é certeza e aventura é medo e firmeza dúvida e crença a haste que se ergue no céu ou se aninha rente ao chão para que a morte a não vença
A mãe é a outra parte de nós
Sem mãe somos metade sem mãe nada é exacto igual a um igual a infinito onde se tocam princípio e fim onde os tempos se encontram sem tempo presente passado e futuro
A mãe é tudo a mãe é de mais a mãe é o máximo
A mãe é a lágrima que não seca no sorriso que não se apaga a nuvem que chove no sol que aquece a mensagem da luz e da harmonia e dos acordes matinais com que abre o nosso dia
A mãe levanta-se no orvalho das lágrimas da noite e mesmo cansada não perde a voz nem a cor da madrugada
A mãe é a voz que se não teme a voz que se confia a voz que tudo diz nas consoantes do grito nas vogais do silêncio nos abismos da agonia
Mãe
Primeira palavra a nascer a última palavra a morrer a mãe é sempre a mesma a mãe nunca é outra na sua infinita diferença
A mãe é criação a mãe é sempre o fim da obra-prima inacabada a mãe nunca é ensaio nem esboço nem projecto
A mãe é um milagre no milagre do mundo o único milagre concebido neste mundo real e concreto
Chora para que outros riam ri para que a dor a não mate mistura-se com a luz das estrelas para vencer a escuridão devora as nuvens por um raio de sol
A mãe é beleza e poesia aurora fulgurante aurora adormecida a mãe é bela porque é simples a mãe é simples porque nasce da silenciosa lógica da vida
A mãe é o que é a mãe é a fragilidade da semente a força do tronco a beleza da flor a doçura do fruto o dom de renascer
A mãe é tudo numa coisa só
Amor

adão cruz

(eurodeputada italiana Licia Ronzulli)





Retirado do blogue Aventar

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Uma carta é suficiente


para a Xia

uma carta é suficiente
para me transcender e enfrentar-te
quando falas

e assim que o vento sopra para o passado
a noite utiliza
o seu próprio sangue
para escrever um verso secreto
que me relembra que
cada palavra é a última palavra.

e o gelo no teu corpo
se dissolve num fogo mitológico;
nos olhos de quem executa
a fúria torna-se pedra.

dois pares de caminhos-de-ferro
inesperadamente sobrepostos, os
insectos embatem nas lâmpadas
de luz, um sinal eterno
que persegue a tua sombra.



Liu Xiaobo
tradução de Pedro Calouste

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